Em fiscalizações realizadas em novembro passado no RN, o MNPCT constatou irregularidades. Foto: José Aldenir/Agora RN
Órgão colegiado vinculado ao governo e com participação da sociedade civil, o Comitê Estadual de Prevenção e Combate à Tortura do RN (CEPCT/RN) vem alertando as autoridades dos poderes Executivo e Judiciário, desde 2021, sobre a possibilidade de ocorrência de eventos de segurança pública como o ocorrido.
Em nota divulgada nesta quinta-feira, 16, o Comitê destaca que ações criminosas só podem ser combatidas com estratégias eficazes que identifiquem as raízes desse problema social. “Sem a adoção de uma política progressiva de desencarceramento e penas alternativas, o RN tem um conjunto de fatores que agravam a situação da segurança pública”, diz.
O CEPCT/RN descreve, em nota, a situação das unidades prisionais: superlotação; polícia criminal insuficiente, mal remunerada e com problemas psicossociais diante da tensão diária; saúde física e mental comprometida devido a equipes insuficientes e cuidados de saúde precários; ações e práticas cotidianas e coletivas de tortura, etc.
Em fiscalização realizada em novembro passado no RN, o Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura (MNPCT) constatou marmitas com alimentos estragados; presos com tuberculose usados como vetor de contaminação para outros presos; prisão por mais de 30 dias em celas de castigo e outras torturas.
Desde a chegada do MNPCT ao RN, juntamente com o CEPCT/RN, os órgãos têm procurado dialogar com a gestão estadual, solicitando uma reunião para contribuir com a política penitenciária e resolver casos concretos e cotidianos de tortura. No entanto, até o momento, o gabinete máximo do governo não está aberto ao diálogo, segundo o Comitê.
“Repudiamos totalmente os acontecimentos recentes, mas, paralelamente, destacamos a importância de tomarmos medidas de curto, médio e longo prazo para que não vejamos piorar a situação da segurança pública nas mãos de quem faz jogo político com vidas”, diz o CEPCT/RN.
A comissão propõe, entre outras medidas, a criação de um gabinete temporário de crise envolvendo órgãos oficiais e a sociedade civil; o mapeamento dos possíveis gatilhos da crise; análise de risco em todas as unidades prisionais do estado e ampliação do monitoramento no sistema, resguardando profissionais, pessoas privadas de liberdade, familiares e sociedade.
Também destaca o apoio administrativo e de segurança como ações importantes para promotores, juízes, advogados, defensores públicos e populares de direitos humanos e representantes da sociedade civil para monitorar a situação; um plano de emergência para corrigir o acesso ilegal à água, alimentação e saúde dentro das unidades; o estabelecimento, em conjunto pelo TJRN, MPRN e DPE, de ações de revisão processual com o objetivo de reduzir a população carcerária do estado, etc.
NOTÍCIA PÚBLICA
ACONTECIMENTOS RECENTES NA SEGURANÇA PÚBLICA NO RIO GRANDE DO NORTE E A SITUAÇÃO DO SISTEMA PRISIONAL
O Comitê Estadual de Prevenção e Combate à Tortura do Rio Grande do Norte (CEPCT/RN), órgão colegiado responsável por contribuir com a política estadual de prevenção e combate à tortura, acompanha com preocupação os recentes acontecimentos no campo da segurança pública no o estado, inclusive, com a possibilidade de que essas cenas se agravem e vivamos uma situação semelhante a outras que já ocorreram. Para evitar isso, trazemos nesta nota pública um breve contexto sobre a situação do sistema prisional do norte do Rio Grande do Sul, que pode ter desencadeado essa situação atual, e propomos algumas ações emergenciais e estruturantes para uma política de segurança pública que assegure eficiência na proteção dos direitos individuais e coletivos.
Embora parte da sociedade entenda esses eventos como eventuais, o CEPCT/RN já vem alertando as autoridades do Poder Executivo Estadual, do Poder Judiciário Estadual e do Poder Judiciário Nacional sobre a possibilidade de tais eventos desde 2021. É preciso agir rapidamente, mas também com cautela e afastar-se da fúria punitiva, que há muito se mostra ineficiente para uma política de segurança pública. Em nossa sociedade existe um conjunto de determinações que constituem facções, milícias e “carreiras criminosas” que só podem ser combatidas com estratégias efetivas que identifiquem as raízes desse problema social.
Nesse sentido, destacamos a atual situação do sistema prisional do RN. Sem a adoção de uma política de desencarceramento progressivo e penas alternativas, o RN apresenta um conjunto de fatores que agravam a situação da segurança pública: unidades prisionais superlotadas; polícia criminal insuficiente, mal remunerada e com problemas psicossociais diante da tensão diária; ausência de políticas de ressocialização; pessoas privadas de liberdade sem contato com o mundo exterior; problemas de saúde física e mental devido a equipes insuficientes e cuidados de saúde precários; condições de detenção insalubres; ações e práticas cotidianas e coletivas de maus-tratos, tortura e tratamentos cruéis, desumanos e degradantes, como os chamados “processos”, entre outras condições que tornam o Sistema Prisional do RN um Estado de Coisas Inconstitucional.
Ao contrário do que apontam grupos políticos ou setores do governo e do judiciário, não são as chamadas “vantagens” que constituem o problema. Entendemos que a garantia dos direitos humanos básicos é a única forma de contribuir para a solução dos conflitos recentes. Isso tem sido repetidamente observado: naquelas unidades onde há garantias, mesmo que mínimas, de sobrevivência, a tensão diária diminui, mesmo que não completamente. Ressaltamos, portanto, que muito mais que uma escolha, a garantia dos direitos previstos no ordenamento jurídico nacional e internacional é uma obrigação do Estado.
Nesse sentido, ressaltamos nossa discordância e total repúdio aos acontecimentos recentes, mas, ao mesmo tempo, destacamos a importância de tomar medidas de curto, médio e longo prazos para que não vejamos piorar a situação da segurança pública no mãos de quem faz jogo político com vidas. Para contribuir com o debate e o estabelecimento de soluções efetivas, propomos:
- A criação de um escritório temporário de crise envolvendo os órgãos do Executivo, Judiciário (TJRN, MPRN e DPE/RN) e Sociedade Civil, com o objetivo de monitorar a situação da segurança pública e, em particular, do sistema prisional norte-americano . rio-grandense;
- Mapeamento de possíveis gatilhos de crise, bem como análise de risco em todas as unidades prisionais do estado;
- Ampliação do monitoramento no sistema prisional, de forma a proteger policiais criminais, pessoas privadas de liberdade, técnicos, familiares e a sociedade como um todo de possíveis retaliações ilegais e criminosas, bem como de possíveis rebeliões;
- Apoio administrativo e de segurança para promotores, juízes, advogados, defensores públicos, defensores populares de direitos humanos e representantes da sociedade civil para monitorar a situação no sistema prisional;
- Apoio, com o devido pagamento de diárias operacionais, ao trabalho dos policiais penais;
- A criação de um plano de emergência para corrigir as ilegalidades e a falta de direitos básicos das pessoas privadas de liberdade, especialmente no que diz respeito ao acesso à saúde, alimentação e água no curto prazo, educação, trabalho, assistência religiosa e contato com os meios de comunicação termo mundo exterior;
- A instituição, juntamente com o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, o Ministério Público do Rio Grande do Norte e a Defensoria Pública do Rio Grande do Norte, de esforços conjuntos para revisão de processos, a fim de reduzir imediatamente a população carcerária que já atendeu a pena privativa de liberdade, com atenção especial às mulheres, pessoas com deficiência, pessoas LGBTI+, idosos, indígenas e pessoas com problemas de saúde física e mental;
- A instituição ou revisão do protocolo de uso da força com base na garantia da integridade física e demais direitos das pessoas privadas de liberdade e dos trabalhadores do sistema prisional;
- Em caso de uso necessário da força, o transporte imediato da pessoa privada da liberdade para realização de perícia no Instituto Técnico-Científico de Perícias (ITEP);
- Divulgação contínua e transparente de possíveis ocorrências dentro do sistema prisional, inclusive em casos de uso excessivo da força ou possíveis mortes.
Por fim, ressaltamos que tais ações emergenciais não eximem a responsabilidade do Poder Executivo Estadual e do Judiciário diante das constantes e reiteradas denúncias que emergem da tortura diária no sistema prisional do Rio Grande do Norte. O Plano de Governo apresentado pelo Poder Executivo estadual tem sido sistematicamente descumprido no que se refere a “garantir o efetivo cumprimento da Lei de Execuções Penais, no âmbito das atribuições do Estado, observados os critérios de humanização e respeito aos direitos da população carcerária”, entre outros. pontos. Se fossem seguidas as recomendações dos órgãos competentes, provavelmente não passaríamos por uma situação como essa. A CEPCT/RN se coloca de frente na defesa dos direitos humanos de toda a sociedade do Norte Rio Grande e destaca que é a classe trabalhadora, especialmente sua parcela negra e as mulheres, quem mais sofre com esses acontecimentos e com o discurso belicoso que não resolverá seus fundamentos.
Natal, 15 de março de 2023.
COMITÊ ESTADUAL DE PREVENÇÃO E COMBATE À TORTURA DO RIO GRANDE DO NORTE
BIENIO 2022 – 2024