Deputados pressionam Anvisa e Ibama com pedido de CPI contra veto a agrotóxicos

Os deputados buscam assinaturas para criar uma CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) sobre atos da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) e do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) que barraram agrotóxicos considerados prejudiciais à saúde.
Proposta pelo bolsonarista Paulo Bilynskyj (PL-SP), a petição afirma que os órgãos favorecem os interesses de algumas empresas e prejudicam o produtor rural.
O pedido pede que sejam apuradas “irregularidades praticadas nos procedimentos adotados nas reavaliações toxicológicas e ambientais de agrotóxicos” realizadas pela Anvisa e pelo Ibama. Segundo o documento, ambos incorrem em infrações e crimes contra a ordem econômica relacionados à concentração de mercado.
Integrantes da Anvisa consideram a CPI uma tentativa de pressionar pela volta ao mercado de produtos que foram proibidos por apresentar risco à saúde de consumidores e trabalhadores do campo.
Até agora, segundo o gabinete do deputado, mais de 122 deputados assinaram o pedido – são necessárias pelo menos 171 assinaturas para arquivar o pedido. A reportagem pediu e não teve acesso à lista de apoiadores para verificar o número de assinaturas.
Uma das principais associações de produtores rurais, a Aprosoja, distribuiu uma carta aos parlamentares pedindo apoio à CPI. O texto é assinado pelo presidente da entidade, Antonio Galvan, alvo de buscas e apreensões em 2021 pela Polícia Federal por liderar atos que pregam a invasão do Congresso e o depoimento dos ministros do STF (Supremo Tribunal Federal).
Na carta, a entidade argumenta que as medidas impedem o acesso a novos produtos e retiram do mercado agrotóxicos sem substitutos.
Aprosoja aponta ainda que “boa parte desses agrotóxicos foi retirada do mercado brasileiro e ainda é utilizada em países como EUA, Austrália, Canadá e Argentina, só para citar alguns, e que competem com o Brasil no mercado mundial para grãos e fibras”.
O pedido da CPI cita decisões da Anvisa que vetaram o uso de paraquat e carbendazim, agrotóxicos usados em larga escala no campo.
O paraquat está ligado à incidência da doença de Parkinson entre os agricultores e foi banido no final de 2020.
A exigência da CPI afirma que a saída desse produto deixou uma lacuna no mercado, já que a produção do agrotóxico substituto, o Diquat, está concentrada em poucas empresas.
No caso do carbendazim, a Anvisa barrou o produto em 2022 considerando o potencial de “causar mutagenicidade, toxicidade para a fisiologia reprodutiva e toxicidade para o desenvolvimento embriofetal e neonatal”.
A agência também afirmou que não há limite seguro para exposição a pesticidas.
Integrantes da agência reguladora da saúde foram ao Congresso para tentar desarmar a tentativa de criação da CPI. O argumento apresentado aos parlamentares é que as revisões são baseadas em análises técnicas.
No processo de reavaliação, a Anvisa seleciona agrotóxicos que podem oferecer risco à saúde de consumidores e trabalhadores rurais e analisa se devem ser mantidos no mercado.
Essa lista de produtos foi elaborada pela agência considerando o “risco de causar câncer, alterações no DNA humano, mutações, problemas reprodutivos e endócrinos, entre outros”, conforme nota do órgão regulador em 2019.
O registro de agrotóxicos não tem prazo de validade. Ou seja, os produtos podem ser comercializados por tempo indeterminado.
A Anvisa afirma, em seu site, que realiza reavaliações para analisar se é seguro continuar usando esses ingredientes, com base em novas informações produzidas por sistemas de monitoramento e pesquisas científicas.
Procurada, a Anvisa não se pronunciou sobre o pedido da CPI.
As entidades que representam os maiores produtores de agrotóxicos não apoiam publicamente a CPI. O setor defende a aprovação de um projeto de lei que afrouxa o controle sanitário para o registro de agrotóxicos, chamado de “PL do Veneno” pelos opositores do texto.
Atualmente, o projeto está parado no Senado.
O Sindiveg (Sindicato Nacional da Indústria de Produtos de Defesa Vegetal) afirmou, em nota, que confia nas instituições brasileiras e no potencial produtivo da agricultura nacional.
“Ao longo dos anos, a entidade vem contribuindo ativa e tecnicamente com os órgãos competentes para a construção de um arcabouço regulatório robusto, moderno e embasado na ciência, visando a cooperação com o crescimento socioeconômico”, afirma o sindicato das empresas.
A FPA (Frente Parlamentar da Agropecuária) não apoia publicamente nem pede o veto da ideia de uma CPI.
A ordem de instalação do CPI tem 30 páginas. Parlamentar em primeiro mandato, Bilynskyj disse à reportagem que não domina questões relacionadas ao agro e que recebeu informações de um denunciante anônimo.
Ele diz, porém, que sua experiência no Ministério Público o habilita a analisar o caso e defende que a Anvisa e o Ibama usam o pretexto de que agrotóxicos fazem mal à saúde para, de fato, fortalecer a grande indústria de produtores.
“Você sabe o que é Alzheimer? Tipo, essa doença existe há um milhão de anos e ninguém pode dizer isso. Então você pega uma coisa que não tem nada a ver e diz: ‘Isso causa Alzheimer’”, disse ele. “Você [o órgão] está focado em obter o resultado. Qual é o resultado? Monopólio.”
Contactado pela reportagem, o Ibama não respondeu. O Ministério da Agricultura e Pecuária, por sua vez, afirmou respeitar a autonomia dos Poderes e disse que a CPI é uma prerrogativa do Legislativo.
“Vale ressaltar, porém, que projetos de lei que tratam da questão dos agrotóxicos já estão em tramitação, o que permite um amplo e eficiente debate sobre o tema”, acrescentou.
“Diante do avanço das pesquisas sobre bioinsumos, proposta que permita desburocratizar, sem, de forma alguma, precarizar a regulamentação desses insumos, mantendo a devida fiscalização de todos os órgãos competentes, como Anvisa, Ibama e Ministério Público , pode apresentar resultados eficientes para a população”, finaliza a nota.
DANIELLE BRANT, JOÃO GABRIEL E MATEUS VARGAS
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS)