Fim da emergência de saúde pública acordado, dizem especialistas

Em pouco mais de três anos, a doença causou quase 7 milhões de mortes e 765 milhões de casos no mundo, mas já era considerada controlada — Foto: NIAID
A decisão da Organização Mundial da Saúde (OMS) de acabar com a classificação da covid-19 como emergência de saúde pública de importância internacional já era esperada e acertada, segundo especialistas de diversas áreas consultados pela Agência Brasil. Em pouco mais de três anos, a doença causou quase 7 milhões de mortes e 765 milhões de casos no mundo, mas já era considerada controlada.
O epidemiologista e professor da Universidade de Illinois Urbana-Champaign, nos Estados Unidos, Pedro Hallal disse que a decisão anunciada nesta sexta-feira, 5, é correta, mas não pode ser mal interpretada.
“O facto de ter sido decretado o fim da emergência não significa que tenha sido decretado o fim da covid-19. A doença ainda existe, mas neste momento acontece em níveis controlados. O que determina o estado de emergência é quando a doença está fora de controle. Então, tendo em conta que se conseguiu o controlo da pandemia, nomeadamente com a vacinação, faz todo o sentido que deixe de ser uma emergência sanitária”, afirmou.
A pesquisadora compara que, assim como outras doenças presentes no cotidiano da população, a covid-19 continuará sendo um problema de saúde pública, apesar de não ser mais uma emergência.
“O diabetes é um problema de saúde pública e não uma emergência de saúde. O infarto agudo do miocárdio, o sedentarismo e a obesidade são problemas de saúde pública, mas não são emergências de saúde. A única coisa que não pode ser confundida é o fim da pandemia com o fim da covid-19”, alerta.
O presidente da Sociedade Brasileira de Infectologia, Alberto Chebabo, disse que a decisão já era esperada, porque a doença tem apresentado dados epidemiológicos compatíveis com outras doenças respiratórias endêmicas, como a gripe.
“A Covid-19 entrou nas características de uma doença endêmica com surtos epidêmicos, como acontece com outras doenças respiratórias. Já não temos o mesmo impacto que tivemos na rede hospitalar, na mortalidade e nos casos graves, como tivemos em 2020 e 2021”, afirmou.
O infectologista destaca o papel da vacinação para que esse cenário tenha mudado e também considera que a doença continuará na rotina dos serviços de saúde em todo o mundo.
“Celebramos o fim da emergência internacional de saúde pública, mas a doença continuará presente em nossas vidas. O vírus não vai desaparecer e ainda haverá alguns surtos epidêmicos, como outros vírus respiratórios, que também impactam às vezes com aumento de casos, internações e mortes”.
O infectologista pediátrico Renato Kfouri, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações e presidente do Departamento de Imunizações da Sociedade Brasileira de Pediatria, explica que um dos principais motivos para a emergência durar até hoje foi a necessidade de garantir recursos para países pobres investir no controle de doenças.
“Isso foi mantido, embora alguns países já tivessem abandonado essa terminologia, porque a Organização Mundial da Saúde entende que, para dar recursos aos países mais pobres, investimentos em vigilância e oferta de vacinas, ainda era preciso manter essa denominação”, afirmou. .
Kfouri considera que a pandemia de covid-19 foi provavelmente o maior problema de saúde enfrentado por esta geração, com desafios de diversas naturezas.
“Tivemos grandes desafios, no que diz respeito às políticas públicas de contenção da transmissão, com lockdowns, distanciamentos e uso de máscaras e o uso político dessas recomendações. Muitos negacionistas de países como o nosso e dos Estados Unidos fizeram uso político da máscara, da vacina, ou tentaram minimizar o problema, e infelizmente, depois de pouco mais de três anos, chegamos a esse triste equilíbrio para a humanidade e as famílias. que perderam seus familiares, amigos e entes queridos”.
O médico defende que é preciso aproveitar as lições desta pandemia para se preparar para as próximas, evitando que problemas como o aumento da desigualdade se repitam diante de uma emergência de saúde.
“Essa pandemia pegou todo mundo de surpresa. Não havia suprimentos, não havia máscaras, e os mais pobres, não apenas nos países, mas dentro da mesma população, eram os que mais sofriam. A pandemia acentuou a desigualdade em todos os lugares. Este é um momento de reflexão, para que possamos olhar para frente e para trás e planejar nosso futuro, porque outros virão. Certamente não será o último e espero que possamos estar mais bem preparados para enfrentá-los.”