Governo Lula busca controlar CPI com bloco da Lira para conter crise após queda de ministro

O governo Lula (PT) tentará controlar a CPI conjunta (Comissão Parlamentar de Inquérito) dos atentados golpistas de 8 de janeiro, para minimizar os danos e limitar a ação do bolsonarismo, a fim de conter o desgaste após a primeira renúncia de um ministro na gestão do PT. Incapaz de evitar a criação da comissão, a base de Lula decidiu aderir à criação do grupo após imagens da invasão do Planalto sugerirem a omissão de agentes do GSI (Gabinete de Segurança Institucional) e resultarem na queda do general Gonçalves Dias do comando do corpo.
Pelas contas do governo Lula, sua base de apoio terá direito a 21 das 32 cadeiras do colegiado – 11 no Senado Federal e 10 na Câmara dos Deputados. Para isso, o Palácio do Planalto precisará construir um acordo com a bancada liderada pelo prefeito Arthur Lira (PP-AL), além de convencer os republicanos –que fazem parte de outra bancada, também de viés centrista– a indicar um deputado mais próximo do governo para o colegiado.
Os aliados de Lira dizem que vão tentar colocar um deputado federal como relator do inquérito. O principal candidato é o líder do PP na Câmara, André Fufuca (MA). Se o relator permanecer na Câmara, que depende de acordo político, a presidência deve ser ocupada por um senador. A CPI deve ser lida na próxima semana pelo presidente do Congresso, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), que disse nesta quinta-feira (20) que o governo deveria ter apoiado a comissão desde o início.
Depois, levará algum tempo para que os partidos indiquem membros, elejam o presidente e escolham o relator. Se conseguir lubrificar sua base, o governo poderá assinar o relator e o presidente, o que permitirá grande controle sobre o rumo dos trabalhos. O ministro Alexandre Padilha (Relações Institucionais) disse nesta quinta-feira que a divulgação de novas imagens sobre o dia 8 de janeiro e a consequente renúncia do general Gonçalves Dias do GSI levaram Lula a orientar lideranças do Congresso a apoiar a CPI.
Nas palavras de Padilha, o objetivo é apurar os atentados e impedir a disseminação de falsas teses sobre os atos golpistas. Na prática, o governo tentou até o último momento evitar a CPI, instrumento que politicamente tende a beneficiar muito mais as oposições do que os governos. Quando ele falhou, ele começou a apoiá-la para ganhar o controle. “Que [os vídeos] cria uma nova situação política, faz passar o pano aos actos terroristas de 8 de Janeiro [tentem] criam uma teoria da conspiração absurda, um verdadeiro terraplanismo plano, a teoria que tentam construir de que as vítimas daqueles atos terroristas (…) [tenham] responsabilidade pelas ações dos terroristas de 8 de janeiro”, disse Padilha.
Também nesta quinta-feira, Lula disse que seu primeiro ministro a cair decidiu sair “por conta própria”, ao responder se havia ficado chateado com a demissão do ex-assistente. Sem confirmar o nome de Fufuca, o líder do bloco, deputado federal Felipe Carreras (PSB-PE), disse que o relator deve ser alguém independente, que não se contamine com as disputas políticas que devem ocorrer durante a investigação. “Vamos escolher parlamentares que farão o debate e as investigações com imparcialidade e equilíbrio”, disse à Folha de S.Paulo.
O governo fala em nomear “pessoas experientes” para participar da comissão. Vice-líder do governo no Congresso, o deputado federal Lindbergh Farias (PT-RJ) diz que a ideia “é separar alguns quadros para ficar exclusivamente nessa função da CPI”.
Segundo ele, o PT não aceitará que o autor do pedido, deputado André Fernandes (PL-CE), seja indicado para participar da comissão. “Esse André Fernandes, estamos tomando todas as medidas possíveis para que ele não participe dessa CPI. Ou participe como investigador”, disse, lembrando que o parlamentar publicou nas redes sociais uma foto da porta do armário vandalizada do ministro Alexandre de Moraes após a invasão do STF (Supremo Tribunal Federal).
Membros do governo apontaram nomes que participaram da CPI da Covid. A tropa de choque incluiria os senadores Renan Calheiros (MDB-AL), relator da comissão 2021, e Rogério Carvalho (PT-SE). Em particular, senadores que participaram da CPI da Covid afirmam, porém, que duvidam da eficácia de uma comissão mista e que a oposição deveria aproveitar a plataforma para se promover nas redes sociais.
No Senado, o PL (partido do ex-presidente Jair Bolsonaro) deveria ter direito a apenas uma cadeira. A sigla pretende indicar o senador Magno Malta (ES) como titular e o ex-secretário da Pesca Jorge Seif (SC) como suplente. Líder da oposição no Senado, o ex-ministro de Bolsonaro Rogério Marinho (PL-RN) diz que há “categorias de culpa”, e que uma delas envolve pessoas que não agiram antes e durante os atentados do dia 8.
“É muito melhor o governo relaxar e buscar a verdade do que ficar fazendo manobras durante a CPI para impedir que deponham pessoas que têm que depor”, diz. Na Câmara, lideranças do bloco Lira (PP, União Brasil, PSDB, Cidadania, PDT, PSB, Avante, Solidariedade e Patriota) se reuniram na última quarta-feira (19) para discutir a estratégia do grupo na composição da CPI.
Parlamentares que participaram do encontro afirmaram, com ressalvas, que o grupo pretende escolher nomes considerados independentes, para reforçar que o bloco não é governista nem oposicionista.
Interlocutores do governo, porém, foram convocados para tentar convencer dirigentes da União Brasil a não indicarem bolsonaristas para o colegiado. “Decidiremos na próxima semana quem serão os indicados. O governo vai ter uma boa base, vamos ter maioria”, disse o líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT). Com a criação dos blocos, o PL ficou apenas com a terceira maior bancada da Câmara e terá direito a três cadeiras – perdendo o direito de indicar o relator ou o presidente do colegiado.
O bloco liderado por Lira terá cinco assentos. As cadeiras ainda serão distribuídas entre o bloco MDB-PSD-Republicanos-Podemos-PSC (quatro deputados), a federação PT-PC do B-PV (dois), a federação PSOL-Rede (um) e Novo, que também têm o direito de nomear um deputado. (FOLHAPRESS)