A lei da terceirização vigente no país é irmã gêmea do trabalho escravo e a reforma de 2017 trouxe uma “perversidade à qualidade da relação de trabalho”, afirmou o ministro Luiz Marinho (Trabalho), na Comissão do Trabalho nesta quarta-feira, 12 de Câmara dos Deputados.
A reunião da comissão teve poucas intervenções da oposição e ocorreu sem incidentes, em um cenário completamente diferente do observado na véspera com o ministro da Justiça, Flávio Dino, na Comissão de Segurança e Justiça da Câmara.
Marinho fez inúmeras críticas à reforma de 2017 ao longo das duas horas que esteve na diretoria. Ele descreveu as mudanças aprovadas no governo Michel Temer como uma tragédia e um retrocesso e citou a necessidade de revisitar pontos do texto, mas sem redigir ou revogar.
“A lei da terceirização no país hoje é irmã gêmea do trabalho escravo. Criou a possibilidade de que vale tudo, tudo pode acontecer. Isso é algo que precisa ser considerado”, afirmou o ministro.
As declarações foram feitas enquanto o ministro defendia a necessidade de enquadrar a atividade económica das apps e estudar formas de proteger os trabalhadores destas plataformas.
“Não é uma coisa simples falar do enquadramento económico das novas atividades que as novas tecnologias trazem, que os novos mecanismos, que a evolução traz para os desafios do mercado de trabalho”, disse.
Segundo Marinho, é preciso avaliar uma cesta de possibilidades na regulação do trabalho por meio de aplicativos. Segundo ele, há “certo viés ideológico” nas afirmações de que alguns trabalhadores são “empresários” e não querem se registrar pela CLT.
O ministro defende que quando se pergunta a estes trabalhadores o que querem com a proteção social, eles respondem “quero Segurança Social, quero 13º [salário], quero férias, quero descanso semanal”. “Ele está querendo então a CLT”, disse Marinho.
O ministro disse que houve um “debate ultraliberal” rechaçando a CLT. “Na história recente do país, houve uma verdadeira pregação contra o trabalho formal. Houve uma verdadeira pregação aqui para a informalidade”, continuou ele.
Marinho voltou a negar qualquer intenção de revogar o texto de 2017 e afirmou que a intenção do governo é construir um diálogo nas relações trabalhistas, com “menos intervenção e mais intermediação”. Ele defendeu que pontos cruciais da reforma sejam revistos, sem citar quais, e negou que o governo esteja pensando em retomar o imposto sindical.
Durante sua participação, Marinho voltou a criticar plataformas como Uber e iFood. “Dizer que é legal um trabalhador ter que trabalhar 16 horas por dia no trânsito para poder levar algo para casa para sustentar os filhos, isso beira o trabalho escravo por excesso de jornada de trabalho.”
Além disso, ele voltou a dizer que, caso essas empresas saiam do país após a regulamentação, outras ocuparão os espaços deixados por elas. “Uma empresa seria bem-vinda para trazer um aplicativo e disponibilizar para trabalhadores e trabalhadoras sem o viés da exploração absurda que o iFood faz, que o Uber faz no Brasil.”
O ministro também falou sobre a retirada comemorativa do FGTS (Fundo de Garantia por Tempo de Serviço) e afirmou que a modalidade apresenta sérios problemas, como o enfraquecimento do próprio fundo para financiar habitação e saneamento.
Além disso, segundo ele, a mudança “criou a possibilidade de farra do sistema financeiro”. “Hoje, dos R$ 504 bilhões depositados na conta corrente dos correntistas do FGTS, já temos quase R$ 100 bilhões vendidos pelos bancos em empréstimos consignados do fundo garantidor no formato saque-aniversário”, criticou. Ele também disse que o governo está discutindo como voltar a discutir esse mecanismo.
Ao final, Marinho foi questionado sobre as propostas que estão sendo estudadas pelo governo para aumentar o salário mínimo, inclusive considerando o PIB per capita no aumento anual acima da inflação.
“É uma das sugestões, entre várias. O martelo do governo ainda não decidiu qual será. Vamos discutir isso com o presidente Lula, assim que ele voltar da China, para sentarmos com as centrais sindicais e fazermos o formato final.”
DANIELE BRANT
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS)