O filólogo Ricardo Cavaliere, 69 anos, foi eleito na tarde desta quinta-feira para a oitava cadeira da Academia Brasileira de Letras, derrotando o quadrinista Mauricio de Sousa.
Cavaliere foi a escolha imediata para a vaga antes que o pai da “Turma da Mônica” colocasse seu nome na disputa, em março, em substituição à professora Cleonice Berardinelli, falecida em janeiro.
Seu favoritismo parecia ameaçado pelo cartunista, mas a realidade mostrou o contrário. Ele teve 35 votos contra apenas dois a favor de Maurício.
Doutor em português pela Universidade Federal do Rio de Janeiro e professor aposentado da Universidade Federal Fluminense, Cavaliere é um dos maiores especialistas em letras e lingüística do país.
Após o doutorado, fez pesquisas ao lado de Evanildo Bechara, um imortal da ABL de 95 anos e referência absoluta em estudos gramaticais no país.
A vaga em disputa pertencia a Berardinelli, que morreu em janeiro aos 106 anos como a mais antiga integrante da Academia, da qual foi a sétima mulher eleita. Especialista em literatura portuguesa, foi uma das pioneiras no estudo de Fernando Pessoa.
Por isso, Cavaliere foi visto como um bom substituto para a cadeira número oito, já que a Academia tem a tradição de substituir seus membros por outros com expertise semelhante – no caso, ambos são pesquisadores da língua portuguesa.
Além de Mauricio e Cavaliere, concorreram os escritores Elois Angelos D’Arachosia, James Akel e Joaquim Branco e o advogado José Alberto Couto Maciel. Nenhum jamais teve uma chance real de ser eleito.
Em nota após o resultado, o cartunista de 87 anos parabenizou o vencedor da disputa e comemorou a discussão sobre o “papel fundamental” dos quadrinhos na formação de leitores.
“Agradeço sinceramente o apoio que recebi nesta campanha e a todos que me honraram com seu voto, acreditando na minha proposta para a ABL. Vou continuar com essa ideia de trabalhar e aprender com os acadêmicos, como vem acontecendo na Academia Paulista de Letras”, diz o texto, referindo-se à instituição estadual da qual o artista é membro.
Desde que Mauricio confirmou sua candidatura, a disputa pela vaga esquentou.
Se o cartunista conquistou rapidamente um pequeno público dentro da Academia, como a atriz Fernanda Montenegro e o escritor Paulo Coelho, e na opinião pública, também foi alvo de ataques.
Akel, que se candidatou à mesma vaga e não obteve votos, foi o mais contundente crítico do artista, gerando polêmica ao dizer que os quadrinhos não eram literatura de verdade e que Mauricio de Sousa nada tinha a acrescentar à ABL. Ele afirmou estar mais preparado para a vaga e tinha um plano de ação que gostaria de implementar na Casa de Machado.
As falas de Akel geraram reações tanto nas redes sociais quanto em matérias como a do editor André Conti, que relembrou outras falas recentes do escritor e jornalista, como a defesa da tortura de guerrilheiros opositores da ditadura e as críticas da TV Globo por, supostamente, “passar uma imagem ruim do regime militar”.
Mauricio de Sousa respondeu aos ataques dirigidos a ele afirmando que os quadrinhos “são revolucionários porque estão entre a literatura e as artes gráficas” e lembrando o americano Will Eisner, que lhe ensinou “que a linguagem dos quadrinhos é uma revolução de ideias”.
Pela segunda vez na história, acadêmicos votaram em urnas eletrônicas, emprestadas pelo Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro, para eleger o novo imortal. A primeira foi na semana passada, quando Heloisa Buarque de Hollanda foi escolhida para a vaga de Nélida Piñon.
WALTER PORTO – SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS)