O julgamento da indicação de políticos para as estatais teve mais uma reviravolta no Supremo Tribunal Federal (STF). O novo capítulo envolve uma queda de braço entre os ministros Ricardo Lewandowski e André Mendonça.
O processo pode amenizar as restrições à nomeação de políticos para cargos de comando em empresas públicas. As regras estão previstas na Lei das Estatais, aprovada durante o governo do ex-presidente Michel Temer (MDB) para impedir o uso de indicações como moeda de troca no jogo político. A ação é movida pelo PCdoB.
O relator do processo é o ministro Ricardo Lewandowski, que está prestes a deixar o tribunal porque completou 75 anos – idade limite para ocupar um cargo na Corte. Nesta quinta-feira, 16, ele suspendeu o trecho da lei, abrindo caminho para nomeações políticas.
Na prática, ao decidir monocraticamente, Lewandowski ‘furou’ o colega André Mendonça. Isso porque Mendonça havia pedido mais tempo para analisar o caso. Ele o fez por meio do instrumento denominado ‘pedido de vista’, prerrogativa de todos os ministros da corte.
Quando há solicitação de visualização, a análise do processo é interrompida. Em regra, a ação só é orientada pela presidência do STF após o ministro liberar os autos ou se tiverem passado mais de 90 dias.
O pedido de vista de André Mendonça foi feito na semana passada, quando foi iniciado o julgamento da ação no plenário virtual do STF. Isso significa que ele pode arquivar a ação em seu próprio gabinete até junho, ou seja, até que Lewandowski se aposente. O processo continuaria na cobrança para o sucessor
Lewandowski decidiu usar os poderes do relator com a justificativa de que há ‘urgência excepcional’ no caso e ‘risco de dano irreparável’, porque as assembleias para eleição de diretores e membros do conselho de administração das estatais estão marcadas para final de abril.
O ministro também submeteu decisão própria ao plenário, o que na prática força a retomada da discussão no colegiado, ainda que de forma preliminar (provisória). O julgamento da decisão monocrática de Lewandowski estava marcado no plenário virtual para os dias 31 de março a 14 de abril.
Em intervalo de menos de quatro horas veio a reação: André Mendonça liberou o processo para julgamento, no mérito, o que significa que a decisão do plenário não será provisória, sobre a suspensão nas regras da Lei das Estatais , mas definitiva, sobre a constitucionalidade dessas normas.
A manobra é inusitada: os pedidos de revisão tendem a demorar consideravelmente mais, tanto que o STF mudou o regimento interno no final do ano passado para determinar que os processos sejam automaticamente liberados para inclusão em pauta se o prazo de 90 dias pois o retorno da visão não é respeitado
Há ainda outra variável em disputa: a modalidade do julgamento. Os interlocutores do ministro Ricardo Lewandowski avaliam que ele gostaria de manter a votação no plenário virtual, longe da TV Justiça e da opinião pública. Mas se algum ministro pedir destaque, a votação precisa ser transferida para o plenário físico.
Cronologia
– Julgamento começa no plenário virtual do STF em 10 de março;
– André Mendonça pede revisão (mais tempo para análise) e interrompe a sessão antes dos votos dos demais ministros;
– Relator, Ricardo Lewandowski aponta ‘urgência’, decide monocraticamente suspender restrições a nomeações políticas em estatais e submete decisão provisória ao plenário em sessão marcada para 31 de março a 14 de abril;
– Mendonça reage rapidamente e manda o processo de volta para julgamento de mérito, em data ainda a ser definida.
Por Rayssa Motta – Estadão