Os relatos dos servidores vão no mesmo sentido: o comando inicial era para evacuar o prédio – Foto: Agência Brasil
O inquérito aberto pelo Gabinete de Segurança Institucional (GSI) para apurar a conduta de servidores que estiveram no Palácio do Planalto no dia 8 de janeiro, quando o prédio foi invadido e vandalizado por radicais bolsonaristas, aponta que a ordem de prisão dos extremistas só veio depois que muitos foram soltos. O material apurado até o momento no inquérito administrativo foi compartilhado com o Supremo Tribunal Federal (STF).
Os relatos dos servidores vão no mesmo sentido: o comando inicial era para evacuar o prédio. A orientação do general da reserva Marco Gonçalves Dias, o G. Dias, ex-chefe do GSI, para prender os golpistas só teria ocorrido após a resistência dos vândalos em deixar o Palácio do Planalto.
O coronel André Luiz Garcia Furtado, então coordenador-geral de Segurança das Instalações do GSI, afirmou que a troca de comando gerou até um “desentendimento” entre oficiais que comandavam o trabalho do Exército e da Polícia Militar do Distrito Federal no prédio.
“Através do Coronel Wanderli, essa tropa da PMDF foi instruída a realizar as prisões, sendo que o referido policial acompanhou a entrada dessa tropa pela rampa da PP. Com a chegada dessa tropa da PMDF, já realizando prisões, a tropa do BGP, comandada pelo coronel Fernandes, que apenas orientava os manifestantes a desocupar o 2º andar, desconhecia o novo despacho do ministro-chefe do GSI, que deu ensejo a um desentendimento entre os comandantes das frações (EB e PMDF), fato devidamente esclarecido pelo coronel Wanderli (DSeg), de modo que, a partir de então, as duas tropas trabalharam juntas para efetuar as prisões dos manifestantes”, ele narrou.
Antes disso, segundo Furtado, os andares superiores estavam desocupados e a maior parte dos golpistas se concentrava na área externa. O general Carlos José Russo Assumpção Penteado, na época número dois do GSI, teria ordenado a saída dos vândalos do local.
“Durante a evacuação dos pisos superiores, os restantes manifestantes, insensíveis às instruções de evacuação, permaneceram no Salão Nobre (2º Piso). Nesse momento, o ministro-chefe do GSI determinou a prisão desses remanescentes, o que foi cumprido pela tropa de choque do Exército”, afirmou.
O coronel Wanderli Baptista da Silva Júnior, ex-subdiretor do Departamento de Segurança Presidencial do GSI, também foi ouvido na investigação. Ele relatou que, a princípio, a ordem era “escanear” o prédio.
“De volta ao Palácio do Planalto (não lembro a hora exata), mas após as ações acima (retirada dos manifestantes), recebi uma ligação do General Gonçalves Dias ordenando a prisão dos manifestantes que estavam dentro do Palácio do Planalto. Highland. Em sequência. Liguei para o general Carlos Feitosa, meu chefe imediato, e confirmei com ele a ordem recebida”, declarou.
Ele disse ainda que houve uma discussão entre os oficiais que coordenavam o trabalho do Exército e a PM no Palácio do Planalto, por causa da mudança de orientação.
“O CMT da tropa da PMDF me retorna, dizendo ‘Comando, vou prender o Coronel do Exército’. Imediatamente me antecipei à tropa de choque da PMDF e fui falar com o Coronel Fernandes, que cumpria a missão de retirar os manifestantes do Palácio e não sabia. Até então, a ordem de prisão determinada pelo Ministro do GSI. Após informá-lo que havia ligado para a PMDF para cumprimento do mandado de prisão, a situação de desencontro de informações entre os dois policiais foi resolvida imediatamente. Aliás, o major da PMDF posteriormente veio me pedir desculpas e também se colocou à disposição para retratar o coronel sobre o mal-entendido”, disse.
O major José Eduardo Natale de Paula Pereira, ex-coordenador de Operações de Segurança Presidencial do GSI, que aparece na filmagem oferecendo água aos vândalos, disse que tentou “negociar” com os golpistas, mas não conseguiu contê-los. Segundo ele, havia cerca de 40 soldados de reação do GSI no momento da invasão.
Natale também narrou que a tropa de choque conseguiu “limpar” o terceiro andar e conter os manifestantes que estavam no segundo andar. “A polícia militar começou a desocupar o Palácio do Planalto quando outros policiais da tropa de choque da PMDF chegaram e o comandante dessa tropa prendeu os manifestantes invasores”, disse. “Vários invasores já haviam desocupado o Palácio Presidencial.”
Assim como nos depoimentos prestados à Polícia Federal (PF), os relatos dos responsáveis do GSI na investigação convergem para afirmar que a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) não emitiu alerta sobre o risco de violência nos protestos do dia 8 de janeiro. O planejamento do Palácio do Planalto teria sido feito com base em informações da PM do DF.
Rayssa Motta – Estadão Conteúdo