Presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) – Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
A bandeira do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) não está mais hasteada nas terras da Embrapa Semiárido, na zona rural de Petrolina (a 712 km do Recife), desde o final da manhã deste sábado, 22 .
Famílias que invadiram a área federal há uma semana, em meio às ações do chamado Abril Vermelho, migraram para um acampamento provisório em área vizinha, onde aguardam o cumprimento da promessa de novos assentamentos do governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT ) governo.
A invasão da fazenda da Embrapa prejudicou a relação do MST com o governo Lula, que endureceu suas declarações contra o movimento após o episódio.
A onda de invasões irritou o presidente Lula, que teme que as ações causem desgastes no governo, principalmente com o agronegócio. Há também o temor de que esse movimento atrapalhe o andamento de agendas de interesse do governo Lula no Congresso.
A desistência do grupo começou na última quinta-feira, dia 20, logo após uma reunião de dirigentes do MST com o Ministério do Desenvolvimento Agrário e o Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária).
O convênio firmado prevê o levantamento das famílias acampadas, a compra de cinco propriedades na região para o assentamento de todos e o envio de lonas e cestas básicas para atender o grupo enquanto aguardam as novas terras.
Líderes do movimento se dizem esperançosos de que a resolução seja cumprida. Mas estão dispostos a voltar a ocupar a Embrapa Semi-Árido se o governo federal não cumprir a sua parte.
O novo acampamento fica a cerca de 40 metros da fazenda, em um local estratégico caso precisem retornar.
A Justiça chegou a determinar a reintegração de posse do local, dando 48 horas para despejo pacífico. A intimação foi entregue na quinta-feira, 20. Na manhã deste sábado, 22, uma viatura da Polícia Federal travou na rodovia próxima à fazenda, mas os agentes não intervieram.
Líder da ocupação, Florisvaldo Araújo Neves afirma que a saída dos sem-terra da fazenda não foi motivada por ordem judicial.
“Se não houvesse negociação [com o governo], não iríamos escapar tão fácil. É natural que toda empresa, seja ela pública ou privada, entre com pedido de reintegração de posse. Mas o processo de resistência depende de nós.”
Ele também destaca o alerta quanto ao cadastramento das famílias, primeiro passo do acordo com o governo. “Se você não ligar, nosso sinal vermelho já está ligado”, diz o agricultor.
Homens, mulheres e até crianças ajudam a construir o novo acampamento erguido em área cedida pelo Assentamento Josias e Samuel, também do MST.
Os barracos foram montados com estacas retiradas do local, lonas e palha de coco. O acabamento é feito com pregos e até amarrações com restos de mangueiras de irrigação, recolhidos em áreas vizinhas.
São mais de 600 famílias no grupo, que ultrapassa 2.000 pessoas. A maioria veio da zona urbana de Lagoa Grande (PE), cidade vizinha, e do próprio município de Petrolina.
Segundo as lideranças do movimento, a maioria são trabalhadores rurais que não possuem terras e eram empregados de fazendas da região.
O agricultor Célio Costa, 45, foi um dos que saíram de Lagoa Grande. “Sou agricultor desde pequeno e precisamos de um pedaço de terra para plantar e criar pequenos animais”, diz.
Ele deixou a esposa em casa e foi para o acampamento com outros quatro membros da família, incluindo cunhados e sobrinhos.
O grupo que forma o chamado “Assentamento Embrapa” se reúne há quatro anos. Eles contam que já monitoravam a área, que, segundo eles, não era utilizada pelo órgão federal.
A Embrapa, porém, afirma que o terreno é para preservação da caatinga e que sua invasão tem comprometido a vida de animais ameaçados de extinção, além de pesquisas para conservação ambiental e uso sustentável do bioma, realizadas no local.
A área pertence à antiga Unidade de Serviços, Produtos e Mercados, hoje pertencente à Embrapa Semi-Árido. Segundo o órgão, ele é utilizado para montagem de diversos experimentos e multiplicação genética de mudas e sementes.
O MST de Pernambuco afirmou, em nota, que nada foi danificado pelas famílias e que nenhum animal foi ameaçado.
Enquanto o repórter estava no acampamento na manhã deste sábado, foi realizada uma assembleia de sem-terra da ocupação.
Eles receberam orientações de lideranças reforçando o convênio com o governo federal, pediram a união das famílias e destacaram regras de organização interna, como limpeza do acampamento, construção de banheiros públicos e cuidado com incêndios na área.
O consumo de bebidas alcoólicas é proibido entre os campistas.
O espaço onde o MST foi instalado será utilizado, em agosto deste ano, para a 10ª edição da Mostra do Semiárido. A feira apresenta novas tecnologias para os agricultores familiares da região e costuma receber mais de 20 mil pessoas de vários estados do Nordeste.
Essa foi a maior área invadida pelo MST em Pernambuco no Abril Vermelho deste ano. No estado, oito áreas foram ocupadas por 2.280 famílias sem-terra. Por todo o país, fazendas e sedes do Incra foram invadidas. O movimento afirma que são terras improdutivas.
O MST pressiona o governo Lula a apresentar um plano de ação para a reforma agrária para os próximos quatro anos e atender a demanda das famílias acampadas e assentadas. Os sem-terra estão insatisfeitos com a lentidão da gestão federal na questão.
A entidade estima que cerca de 100 mil famílias vivam em acampamentos no Brasil. Destes, 30 mil estão em áreas em processo de regularização não concluídas pelo Incra.
Em conversas com o governo, o MST defende que é papel do movimento pressionar para que a reforma seja uma prioridade de fato do Executivo.
ADRIANO ALVES
PETROLINA, PE (FOLHAPRESS)