Pesquisa confirma comprometimento da memória em pessoas infectadas com covid-19

Pesquisadores da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UniRio) descobriram que a proteína Spike do SARS-CoV-2, quando injetada no cérebro de camundongos, induz alterações na memória. Essas alterações ocorrem tardiamente, em torno de 20 a 30 dias após o contágio, como acontece com humanos infectados pelo vírus da covid-19.
“Imita bem o que acontece na doença. Quando isso acontece, estamos diante de um bom modelo experimental”, disse à Agência Brasil a neurocientista Claudia Figueiredo, da Faculdade de Farmácia da UFRJ, uma das líderes da pesquisa. O artigo foi publicado na revista internacional Cell Report.
Pesquisas clínicas com pacientes que já tiveram covid-19 mostraram que, depois que passa a fase aguda da doença, eles apresentam comprometimento da memória que aparece meses depois. Segundo Claudia Figueiredo, o experimento mostrou que não era necessário ter o vírus replicado em camundongos, mas que bastava a proteína estar disponível no cérebro para causar danos à memória.
“Fizemos progressos na caracterização do mecanismo. E isso é superimportante porque, quando a gente descobre o mecanismo, abre portas para terapias mais direcionadas”. Para avaliar a função de memória dos camundongos, os pesquisadores usaram diferentes estratégias comportamentais, incluindo reconhecimento de padrões e testes de labirinto aquático.
Bloquear
Ao mesmo tempo, os 25 pesquisadores das duas instituições identificaram moléculas que, quando inibidas, não há perda de memória. Para bloquear as moléculas que causavam perda de memória, foram usados animais geneticamente modificados que apresentavam uma deleção, ou remoção, de uma proteína.
“Vimos que os animais que tinham uma deleção nessa via não desenvolviam comprometimento da memória. Foi então utilizado um inibidor desta via e observou-se que, quando a via é inibida, a proteína Spike não exerce esta patogênese na memória através desta proteína. Essa descoberta pode ser uma forma de evitar essa perda de memória”, explica Claudia.
O neurocientista informou que já existem medicamentos no mercado, usados no tratamento da artrite reumatóide, que poderão ser testados em doentes com covid-19 ou que já tiveram a doença, para ver se é possível prevenir esta perda de memória. “Pode ser uma situação de reposicionamento de drogas”, apontou ela. Ela alertou, porém, que para que esses remédios sejam usados em humanos, é preciso fazer testes clínicos em pacientes.
testes clínicos
A ideia, a partir de agora, é que outros grupos de cientistas que trabalham com pesquisa clínica se dediquem a testar essas ferramentas, para que estejam à disposição dos pacientes, uma vez que os medicamentos disponíveis no mercado para outras doenças já passaram pela fase de testes . avaliação de toxicidade.
“Deve ser testado em pacientes que tiveram covid e têm maior probabilidade de desenvolver comprometimento da memória ou em pessoas que apresentam fatores de risco para desenvolver essas perdas de memória”. Segundo Claudia Figueiredo, é importante que os exames sejam realizados logo após o paciente ter covid-19, como forma de prevenção. “Você não pode esperar que o comprometimento da memória se instale,” ela apontou.
O estudo foi financiado pela Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Rio de Janeiro (Faperj) e pelo Instituto D’Or de Pesquisa e Ensino.