Ex-presidente Jair Bolsonaro ao lado de Michelle – Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – A Polícia Federal diz ter identificado uma possível articulação para desvio de dinheiro público no governo Jair Bolsonaro (PL) a pedido da ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro.
Segundo a PF, a suspeita envolve a assessoria da mulher do ex-presidente e de seus funcionários da Assessoria de Ordens da Presidência, chefiada por Mauro Cid, preso sob suspeita de falsificação de carteiras de vacinação.
Em setembro do ano passado, a Folha revelou que a PF havia descoberto as transações suspeitas após analisar dados encontrados no celular e na nuvem de Cid, que era o braço direito de Bolsonaro no governo.
A linha investigativa da PF está em uma das investigações denunciadas por Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal). A polícia fala da suspeição em pedidos de quebra de sigilo bancário e o ministro também menciona nas suas decisões que autorizaram as medidas.
Ao autorizar a prorrogação da quebra de sigilo do Cid, de funcionários da Presidência e de pessoas ligadas a Michelle, Moraes afirma que os elementos colhidos pela PF revelam “fortes indícios de desvio de dinheiro público, por meio de despachos da Presidência da República ” a pessoas indicadas por dois assessores da ex-primeira-dama.
O delegado do caso diz no documento a que a Folha teve acesso que ainda seriam necessárias mais investigações, mas que havia indícios no sentido do desvio.
O advogado de Cid, Bernardo Fenelon, afirmou que “por respeito ao Supremo Tribunal Federal, toda e qualquer manifestação defensiva será apresentada nos autos”.
Conforme mostrou a Folha na época, conversas escritas, fotos e áudios trocados por Cid com outros assessores sugerem a existência de depósitos fracionários e saques em dinheiro.
O material analisado pela Polícia Federal também indica que as movimentações financeiras eram destinadas ao pagamento de contas pessoais de Michelle.
A PF cruzou essas transações e descobriu que os valores custavam um cartão de crédito em nome de Rosimary Cardoso Cordeiro, mas utilizado por Michelle.
Conforme revelado pelo UOL neste sábado (13), áudios de conversas entre duas assessoras da primeira-dama, Cintia Borba Nogueira e Giselle dos Santos Carneiro da Silva, entre si e com Mauro Cid sugerem preocupação com o pagamento das contas de Michelle.
A Folha também teve acesso à transcrição das conversas. Em um dos áudios, os envolvidos afirmam que a situação com o cartão usado por Michelle é preocupante.
“A análise dos gastos efetuados no cartão adicional em nome de Michelle, considerando a natureza e localidades, como estabelecimentos de alto padrão, locais de acesso complicado quanto ao grau de segurança e exposição, indicam que possivelmente foram gastos efetuados por uma terceira pessoa, diferente da primeira-dama”, diz a PF em documento obtido pela reportagem.
Ao pedir o novo descumprimento, o delegado do caso apontou uma dificuldade enfrentada na investigação.
Segundo ele, os investigados fazem depósitos em espécie e em frações, em grande parte utilizando terminais de autoatendimento e depósitos em dinheiro na conta de Mauro Cid.
Em uma das conversas citadas pela PF, de abril de 2021, Cid envia uma GRU (Guia de Arrecadação Sindical) de Maria Graças de Moura Braga e orienta o pagamento citando pedido do PR (Presidente da República).
“PR instruído a pagar em dinheiro. Para evitar interpretações erradas”, dizem as mensagens.
No mês seguinte, um assessor de Michelle volta a procurar Cid para falar sobre o pagamento de Maria das Graças, que é casada com um tio da ex-primeira-dama.
Nesse momento, Cid responde: “PR pediu a PD que falasse com ele sobre todos os pagamentos”.
Também chamou a atenção da PF um áudio em que Cid fica nervoso com o envio pelo assessor de Michelle de um boleto de pagamento em nome de um terceiro que não faria parte da família presidencial.
“Não tem como enviar esse tipo de ticket. Quando for o caso, é só me mandar o pedido do dinheiro que você paga, porque isso não é despesa do presidente, nem da dona Michelle”, disse.
Depois acrescentou em outra mensagem: “Não me meto, não quero me meter nas despesas dela. Mas não me comprometa, por favor, ok? Quando for o caso, você pede o dinheiro e eu passo para você”.
Apesar de a conta, a mensalidade do plano de saúde de um dos irmãos de Michelle, ser de alguém de fora da família presidencial, Cid a encaminhou ao grupo de ajudantes de campo para ser paga, segundo a PF, com dinheiro público .
O recibo em nome do Auxílio Ordens de Bolsonaro está anexado a uma das mensagens e foi recuperado pela PF.
À época da revelação, a assessoria de imprensa da Presidência informou que Cid fez saques na conta pessoal de Bolsonaro e os repassou para uma tia de Michelle –que acaba trabalhando como babá da filha de Bolsonaro, Laura–, além do custeio de outros despesas presidenciais, por questões de segurança, para não expor a conta pessoal do presidente.
“O dinheiro é sacado da conta dele e o depósito é feito na conta da tia (que atua como babá). Por questões de segurança, não houve transferência de conta para conta. Ele sacou o dinheiro para que sua conta não ficasse exposta com o nome dele no extrato de outra pessoa”, disse a Presidência na época.
Esta é a mesma justificativa para outras despesas.
“Todas essas despesas são pessoais e diárias para Michelle. Cabeleireira, manicure, compra no site de roupas e outras coisas. A opção foi não colocar a conta do presidente na manicure, fisioterapeuta ou outras despesas diárias de uma família com cinco pessoas”, disse ela.
Um documento da PF, porém, contraria a versão. Segundo a PF, do material analisado, apenas uma transação para Rosimary saiu da conta de Bolsonaro
Em 24 de novembro de 2020, Cid, que era advogado da conta do então presidente, sacou R$ 8 mil e posteriormente depositou para a mulher.