Sociedade deve se engajar no combate à desinformação, diz pesquisador

A pesquisa avaliou postagens em diversas redes sociais e constatou que a extrema direita foi mais eficaz no engajamento dos usuários – Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil
As campanhas de desinformação aumentaram no Brasil durante as eleições de 2022. Segundo pesquisa divulgada na semana passada pelo Instituto Igarapé, publicações de conteúdo enganoso e conspiratório nas redes sociais buscavam diminuir a confiança no sistema eleitoral, atacar instituições democráticas, difamar adversários e influenciar a ação de apoiadores.
A pesquisa avaliou postagens em várias redes sociais e descobriu que a extrema direita era mais eficaz em engajar os usuários. E isso ocorreu até nas redes onde a esquerda fez mais publicações.
Segundo o levantamento, no Facebook, por exemplo, a esquerda fez 491 mil publicações, 16% a mais que a extrema direita, que fez 411 postagens. No entanto, o engajamento da direita superou o da esquerda. Foram 361 milhões de interações contra 217 milhões (quase 40% a menos).
“Toda ou quase toda a extrema direita se ocupava de questões relacionadas à política, enquanto a esquerda falava de política, mas também falava de acontecimentos cotidianos, avanços tecnológicos, acontecimentos com celebridades. A extrema direita era muito mais organizada para fazer política e a esquerda era mais dispersa”, disse Maria Eduarda Assis, pesquisadora do Igarapé.
O estudo constatou a existência de narrativas como a de que a cédula impressa é o único método confiável, de que as urnas eletrônicas e as pesquisas eleitorais não são confiáveis, além da alegação de fraude e incompetência do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Isso foi feito na tentativa de desmoralizar o sistema eleitoral brasileiro.
Além disso, houve aumento do envolvimento de militares e policiais no processo eleitoral, ataques ao TSE e ataques pontuais ao ministro Alexandre de Moraes.
De acordo com o Instituto Igarapé, o TSE tornou-se alvo preferencial de ataques devido às repetidas determinações para remover a desinformação online e restrições ao uso de imagens oficiais do então candidato à reeleição Jair Bolsonaro.
Quanto ao ataque às instituições democráticas, foram percebidos discursos como o de que o Judiciário favorece a esquerda brasileira. Houve também pedidos de impeachment de juízes; ataques contra o STF; e ataques a outras instituições, como o Legislativo, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e o Ministério Público (MP).
Para difamar o adversário, foram adotadas narrativas como a associação de Lula e seu partido, o PT, ao nazismo, bandidos, corrupção, invasão de terras, comunismo e ditadura; e a associação de Bolsonaro e seus aliados com perversão sexual e moral, canibalismo e Maçonaria.
Por fim, na busca de influência nas ações dos apoiadores, os discursos envolveram temas como a luta entre o bem e o mal, o risco de ideologias baseadas em gênero e identidade, as ameaças do comunismo e da ditadura e os protestos contra os resultados eleitorais e a tentativa para obter apoio de segmentos do eleitorado (como grupos historicamente marginalizados, nordestinos, público religioso e grupos armados).
O estudo mostrou que, nos últimos anos, instituições como o Supremo Tribunal Federal (STF) e o TSE, plataformas de mídia social e grupos da sociedade civil têm trabalhado para combater a desinformação, antes e durante o ciclo eleitoral de 2022. parcerias fundamentais para reduzir os danos e conter o problema.
“As instituições estavam muito mais preparadas em 2022 do que em 2018. Nossa análise é que, em 2018, as instituições quase foram pegas de surpresa [com a desinformação em massa]enquanto em 2022 já havia uma expectativa de que isso acontecesse”, diz Maria Eduarda.
De acordo com o estudo, as empresas de tecnologia, que antes não conseguiam combater a desinformação, agora são obrigadas por ordens judiciais a implementar políticas mais responsáveis. “Não era [um combate à desinformação] sucesso total, mas temos que considerar que foram muitos esforços e avanços. O facto de não ter sido 100% eficaz tem muito a ver com este fenómeno: a velocidade das narrativas, o seu alcance, com um carácter muito descentralizado de produção e divulgação. Isso torna a moderação muito mais desafiadora”, explica o pesquisador.
Segundo o Instituto Igarapé, para combater as campanhas de desinformação é preciso ter iniciativas que capturem e contenham notícias falsas antes que elas se tornem virais. “No entanto, dado que numerosos estudos têm demonstrado que, uma vez publicadas, as notícias – enganosas ou não – têm um notável ‘poder de adesão’, prevenir o contágio não será uma tarefa simples.”
Para o instituto, o combate à desinformação depende fundamentalmente do trabalho colaborativo entre interesses diversos, por vezes divergentes. É necessário manter a atribuição de responsabilidades a instituições públicas, sociedade civil e plataformas de redes sociais.
Por fim, segundo Igarapé, é importante que a sociedade como um todo se engaje no debate para traçar regras, limites e estratégias para a regulação responsável do conteúdo nas redes sociais.