Vendas de canabidiol crescem, mas produção nacional ainda é pequena

O uso terapêutico de substâncias extraídas da planta da maconha mais que dobrou no ano passado no Brasil, mas a produção continua muito limitada no país, devido à proibição. Muito do que é consumido legalmente é importado ou produzido por quem obtém decisão favorável na Justiça.
Segundo o Sindicato da Indústria de Produtos Farmacêuticos do Estado de São Paulo, a venda de caixinhas de remédios à base de canabidiol passou de mais de 50 mil em 2021 para mais de 170 mil em 2022.
Há alguns anos, a diretora de operações Talita Coelho foi diagnosticada com uma depressão profunda que a impedia de sair de casa. Foi o tratamento com Cannabis que a fez superar as crises de ansiedade. Ela obteve autorização na Justiça para cultivar a planta e dela extrair o óleo essencial.
“Cultivar dá muito trabalho, então o habeas corpus não é uma solução definitiva para tudo que você precisa como paciente. Você tem que se preocupar em estudar cada ciclo das plantas, cultivá-las corretamente, sem ter pragas. Isso é muito difícil quando se trata de Cannabis. É uma planta muito delicada. Você tem que tomar cuidado para não ter nada, porque isso vai se tornar o seu remédio. Adoraria poder comprar meu remédio por um preço acessível e que fosse produzido do jeito que eu confio”, aponta.
O aumento do consumo é incompatível com a oferta no Brasil, já que a lei antidrogas proíbe o cultivo e a exploração comercial da Cannabis, mesmo para uso terapêutico. Nas farmácias já existem remédios com substâncias isoladas da maconha, e também é possível importar direto, mas, em ambos os casos, os custos são altos.
Fazer cultivo pessoal requer autorização da Justiça, e as iniciativas para ofertar o medicamento no Sistema Único de Saúde (SUS) estão apenas começando. Outra alternativa, mais acessível, são as associações.
“Para realmente falarmos em acesso democratizado a esse tratamento, precisamos começar falando do cultivo interno da produção interna desse óleo. O Brasil vem de um processo proibicionista e não podemos ter uma produção aqui por causa da nossa legislação. Hoje em dia, cultivá-lo, manuseá-lo, tê-lo em estoque, até mesmo carregá-lo, tudo isso é considerado ilegal. São condutas proibidas pelo nosso ordenamento jurídico”, aponta Gabriella Arima, diretora da Rede Jurídica pela Reforma da Lei de Drogas.
Em seu consultório, o ortopedista José Wilson Andrade tem percebido o aumento de pacientes que procuram terapias com Cannabis e observa, na prática, os benefícios das substâncias.
“Quando eu prescrevo um derivado da Cannabis, um fitocanabinoide, para um paciente com dor crônica, estarei tratando a dor dele, mas vou melhorar a qualidade do sono dele, vou diminuir um grau de ansiedade, então outros fatores associados à dor crônica também são tratados com a mesma medicação”, explica o médico.
Ele acrescenta que a droga tem menos efeitos colaterais. “Quando falamos de analgésicos, antiinflamatórios, por exemplo, você pode comprar na farmácia, sem receita. Eles têm grandes problemas, em parte renais, em parte gástricos. Existem muitos efeitos colaterais, especialmente em pacientes idosos. E o uso da Cannabis consegue substituir esse tipo de medicamento com muito mais segurança”, avalia.